Adolescência’. Assista, é urgente!

Crianças e adolescentes têm acesso livre às redes sociais com conteúdos que influenciam a saúde mental de maneira indiscriminada Texto da jornalista e colunista Vivian Mesquita
Sim, Jamie matou a menina. Calma, isso não é spoiler e nem resenha da mais recente minissérie da Netflix, “Adolescência”. Stephen Graham, um dos criadores, roteirista e pai de Jamie (Owen Cooper) na trama, deixa claro em todas as entrevistas que a produção nunca teve a intenção de ser um mistério policial. O foco é discutir o porquê. Quais foram as circunstâncias que levaram um jovem comum de 13 anos a assassinar uma colega de escola? A história não é baseada em fatos reais, mas a ideia surgiu de um questionamento de Graham inspirado em casos verdadeiros de meninos que atacaram meninas a facadas até a morte. “Que sociedade é essa onde garotos estão esfaqueando meninas? É preciso uma aldeia para criar uma criança, mas e se todos nós formos os responsáveis? O sistema educacional, os pais, a comunidade e o governo?”, ele pondera. “Adolescência” é um golpe de realidade e não precisa ser pai ou mãe para senti-lo. O artigo 227 do Estatuto da Criança e do Adolescente determina que é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. É dever da sociedade, mas a gente exerce esse dever? Temos a coragem de, por exemplo, denunciar e proteger as crianças “dos outros”? Denunciamos amigos, familiares ou vizinhos que negligenciam a saúde mental de suas crianças? Não, em geral, a gente não se envolve, não “se mete a colher”. Nos últimos anos, os números de casos de depressão, suicídio, ansiedade, diferentes tipos de transtornos e crimes virtuais ou não entre jovens são alarmantes. Nossas crianças e adolescentes têm acesso livre às redes sociais e plataformas com conteúdos que influenciam a saúde mental de maneira indiscriminada. Existem filtros, aplicativos de controle de uso, mas é impossível – pelo menos por hora – blindar totalmente essas mentes. E nós também ainda não aprendemos a lidar com isso. Nossas crianças são a primeira geração da era digital de acesso total sem legislações eficientes que possam protege-las de criminosos, fake news ou conteúdos violentos e tóxicos. A minissérie da Netflix não tem a intenção de culpar pais e nem esse artigo, a reflexão aqui é chamar atenção para o tema e dar luz à discussão. “Adolescência” não trata apenas de masculinidade tóxica, solidão, influências virtuais, comunidades perigosas, machismo estrutural e educação. É também sobre o abismo geracional que enfrentamos. Precisamos conversar, e estamos tão longe de diminuir esse abismo que falar sobre a proibição do uso de celular na escola, por exemplo, é uma grande polêmica! A produção já é considerada por alguns críticos uma das melhores da história e apontada como forte candidata ao Emmy – e eu nem falei da captação em plano sequência que garante uma experiência imersiva absurda. A provocação, aliás, tem fundamento: sentir na própria pele a dor de Jamie, dos pais, da irmã, da terapeuta e dos colegas da escola é urgente. Assistam e comentem aqui, vamos conversar?

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